segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Sono de Inverno (Kış Uykusu) - Nuri Bilge Ceylan (2014)

Escolhi esse filme simplesmente por ter ganhado a Palma de Ouro do Festival de Cannes de 2014. Eu não havia assistido ainda, mas a sinopse me chamou atenção. O filme todo é baseado em conflitos, que se dão principalmente nos diálogos.

Antes de falar deles, porém, gostaria de chamar a atenção para a incrível beleza estética que tem o filme. Tanto as paisagens quanto os cenários internos, todos os enquadramentos foram muito bem pensados. Eu que gosto de pensar na arte do filme (que consiste em cenários, objetos, figurinos, maquiagem e cabelo), adorei todos os conjuntos de objetos. Deu pra ver que para cada espaço houve escolha de determinados objetos. O escritório de Aydin, o personagem principal, tem objetos que o caracterizam (livros, máscaras de teatro, tons de marrom). O quarto de Nihal, sua esposa, tem outros.

Aydin é o dono de um hotel rústico, construído em uma caverna. Ele e sua irmã Necla (que mora com ele) possuem diversas casas na cidade, herança de seus pais, as quais são alugadas por pessoas mais pobres. Após uma breve apresentação do personagem Aydin (que é somente um senhor andando sozinho e depois chegando em seu hotel), a história começa quando ele e seu motorista (e também homem que cobra os aluguéis) estão dirigindo quando um menino joga uma pedra na janela do carro e o vidro quebra. Agora é apresentado o primeiro conflito do filme, entre Aydin e a família do menino, que aluga há anos uma de suas casas, porém está devendo o aluguel há um tempo e Aydin já até os processou.


O que é muito interessante do filme é a naturalidade em que os conflitos, as situações, as conversas (muitas vezes densas) são apresentados, da mesma forma como são apresentados os personagens. É como se nós fôssemos intrusos invisíveis olhando suas vidas. Pensando agora na nossa regra de roteiristas que é "mostrar e não dizer", nesse filme os personagens não mostram, eles vivem (apesar de falarem tanto).


Mais um conflito se dá em algumas conversas entre Aydin e Necla. Ela questiona se o ato de deixar de combater o mal, de não fazer nada a alguém que lhe fez mal, poderia provocar arrependimento a este alguém. Aydin acha uma besteira, mas Necla continua refletindo. 
A mesma conversa continua no dia seguinte, quando Aydin, Necla e Nihal estão tomando café da manhã. Nessa cena o conflito anterior volta, quando o menino que jogou a pedra no carro e seu tio chegam para pedir desculpas. O menino não fala nada, mas desmaia.

No próximo conflito entre Aydin e Necla ela critica o jeito que ele escreve. Nessa cena, assim como nas cenas de Aydin com Nihal, os personagens falam dos defeitos da personalidade do outro, jogam na cara verdades, coisas incômodas. Os diálogos começam devagar, Necla só diz que quer fazer uma pergunta a Aydin, Aydin só diz que quer ajudar Nihal, então as falas vão ficando densas, o ambiente vai ficando incômodo, as verdades são faladas. 
Nesse filme, todos os personagens são complexos. Nenhum deles é perfeito, mas todos são comuns, todos são humanos.

No fim do filme Nihal toma uma atitude que pode piorar tanto o conflito dela com Aydin quanto o conflito dele com a família devedora do aluguel. Ao mesmo tempo, parece que ocorre alguma leve transformação do personagem provocada pelos conflitos. Aydin aparenta mudar algumas atitudes, ou ao menos nós nos permitimos olhá-lo de outro jeito, com a ajuda de um voice over de seu pensamento.Como os humanos, que vemos de um jeito de longe, os familiares o vêm de outra forma, e nós nos enxergamos de outra ainda, assim como agora vemos Aydin.

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