segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Tatuagem - Hilton Lacerda (2013)


Ditadura e liberdade, censura e arte, ciúme e amor, homofobia e cu. Essas são as palavras que me remetem ao filme Tatuagem, de Hilton Lacerda. Um filme intenso, cheio de assuntos para se discutir.

Se pensarmos em um romance entre um militar e uma pessoa contra a ditadura, será uma premissa interessante, mas não muito original (eu mesma tenho uma ideia de longa-metragem com essa premissa). Porém, se esse romance for homossexual, já se acrescenta mais uma discussão. Se um deles não é só contra a ditadura, mas um artista que faz performances críticas a ela, se há alguma diferença de idade entre eles (o bastante para gerar conflito na relação), se há diversos outros personagens interessantíssimos à sua volta, isso torna o filme excelente.
O filme se passa em Recife, em 1978. É apresentado em uma panorâmica um teatro (ou cabaré) escuro, com fantasias penduradas, cortinas arranjadas e um microfone central, enquanto a voz de Clécio apresenta de forma alegre e descontraída o "Chão de Estrelas", seu teatro, e o som da plateia aplaudindo. Logo depois é apresentado um jovem soldado, Arlindo (Fininha) sentado, solitário, em sua cama no quartel enquanto os outros meninos dormem.
Assim os dois personagens e seus mundos opostos vão sendo apresentados. Uma possível homossexualidade oculta de Arlindo, a homofobia de seus colegas de quartel, uma sugestão de um caso dele com um sargento, sua família pobre, sua irmã grávida, sua namorada Jandira.
Enquanto isso, a vida artística de Clécio, seu relacionamento com Paulete, sua ex-mulher Deusa e seu filho criança, sua trupe de teatro, seu mundo culto, libertário e crítico.
É com trinta minutos de filme que os dois se encontram, quando Fininha vai levar uma encomenda de Jandira a Paulete, seu irmão. Fininha aproveita e fica assistindo o show do Chão de Estrelas. É uma cena tão linda que eu tive que colocá-la aqui:


 A partir daí, Arlindo e Clécio começam um relacionamento amoroso. Há muitas cenas sensuais e muito românticas e sensíveis entre eles. Que mostram suas personalidades e mundos tão diferentes mas também a inegável química que possuem.
Diálogos como:
"Arlindo: Eu nunca tinha dançado com um homem assim.
Clécio: Eu nunca tinha dançado com um soldado."

Enquanto acontece a relação dos dois são apresentadas diversas outras discussões relacionadas aos dois e aos personagens à sua volta. Clécio é mais velho, já tem seus ideais firmados, sua ideia de relacionamento. Fininha é novo e está descobrindo sua sexualidade, descobrindo sua ideologia e descobrindo suas crenças. O mundo libertário de Clécio é uma descoberta para Fininha. Um mundo totalmente diferente do que ele conhecia até então. Fininha é o personagem que mais se transforma ao longo do filme, e é nessa transição que acontece alguns conflitos entre eles, tanto de ideologias quanto de relacionamento (ou ciúmes).
Há a homofobia que os dois sofrem separadamente.
Há a censura que a ditadura, da qual Fininha faz parte, faz em cima do trabalho de Clécio e sua trupe.
Há, ainda, uma tatuagem.

Parece-me impossível escrever mais sobre o filme. Escrevo somente para convencê-los de assistir. É preciso assistir para sentir com toda a intensidade as emoções, debates, ideias, questões expostas nesse filme de forma tão artística e genuinamente brasileira.

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